Reflexões sobre o acompanhamento sonoro do primeiro cinema: O caso do carioca Cinema Chantecler (1911)
Resumo
Este trabalho toma como recorte os meses iniciais de 1911, quando o carioca Cinema Chantecler publica os programas musicais que acompanhariam cada um dos filmes ali exibidos. Este artigo é motivado pela excepcionalidade de tal divulgação, quando consideramos o âmbito da exibição cinematográfica do primeiro cinema. Propomos reconstruir, aqui, esses programas cinematográficos através da pesquisa em acervos como a Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional e a Fondation Jérôme Seydoux-Pathé. Para a realização deste trabalho, efetuamos primeiramente um levantamento fílmico e musical dos repertórios citados nos anúncios do Cinema Chantecler publicados na imprensa carioca. Em seguida, procuramos levantar as obras fílmicas que sobreviveram ao tempo, utilizando-nos, na inexistência do filme, da fortuna crítica publicada sobre elas. Trata-se de uma pesquisa calcada na historiografia do cinema silencioso, que visa reconstituir a esfera da exibição considerando as relações existentes entre o filme e o seu acompanhamento sonoro, âmbito muitas vezes relegado a um segundo plano pela crítica devido à dificuldade de se localizarem dados a este respeito. A programação do Cinema Chantecler será analisada a contrapelo das considerações de Rick Altman, segundo o qual se caminha, a partir de 1908, rumo à estandardização de práticas referentes aos usos dos sons no primeiro cinema. Conforme demonstraremos, o contexto brasileiro comporta peculiaridades, uma vez que a música era utilizada tanto como acompanhamento aos filmes quanto como atração per se, na dinâmica da cena teatral que antecedeu e era contemporânea à cena cinematográfica.
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